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Quais são as nuances e desafios em torno do debate da reforma tributária no Brasil?

O Brasil tem importantes desafios a serem enfrentados na discussão e aprovação de reformas estruturantes, que corrijam as rotas equivocadas escolhidas no passado e que efetivamente propiciem a prosperidade tão evidentemente alcançável para um país com tamanhas riquezas.



Possivelmente, a reforma mais difícil de ser endereçada é a tributária. O Brasil possui um sistema demasiadamente complexo, inseguro do ponto de vista técnico e jurídico, com carga elevadíssima e mal distribuída, portanto, injusta, que produz alocação ineficiente de recursos, perversas distorções de peso entre os contribuintes e uma brutal informalidade. Trata-se do que passou a ser chamado de “manicômio tributário”, um dos principais, se não o principal, fator negativo entre todos os itens que compõem o “custo Brasil”.


Sendo assim, seria razoável imaginar que toda a sociedade, principalmente o setor empresarial, estaria em plena sintonia com os representantes que serão eleitos ao Executivo e Legislativo nos âmbitos Federal e Estadual, para discutir e aprovar uma reforma tributária o mais rapidamente possível.


Lamentavelmente, não é o caso. Não foi nos últimos vários governos que passaram e é possível arriscar, sem grandes chances de errar, de que não será no próximo.


São diversos os fatores que levam a essa contradição.


É evidente que no campo político há enormes dificuldades de entendimento entre o Governo Federal, os 27 Estados e os mais de 5 mil municípios que disputam o poder da governança e regulação do sistema, além de arrecadação e destinação dos recursos. Esse obstáculo é amplamente conhecido e, por isso, faz parte das discussões de maneira aberta e transparente. 


Por outro lado, é o interesse e o posicionamento do setor privado que parecem não estar totalmente claros, pelo menos não de forma pública, objetiva e transparente para uma discussão mais democrática com toda a sociedade.


No Brasil, o sistema tributário é tão complexo, que até mesmo reduções de carga de impostos encontram fortes resistências de onde nunca deveriam vir – do próprio setor privado.


Os famosos “puxadinhos” oriundos, por exemplo, de zonas incentivadas, guerra tributária estadual, programas estaduais de desenvolvimento portuários, programas de desenvolvimento regionais, entre muitos outros, que produziram uma teia de interesses tributários difusos no setor privado, em especial no setor industrial, até mesmo conflitantes dentro de um mesmo setor.


Para ilustrar esse possível interesse contraditório, observa-se como exemplo um importante grupo industrial que possui ações negociadas na Bolsa de Valores, cuja publicação de resultados faz referência a um amplo conjunto de incentivos tributários gozados em suas operações. No âmbito federal, a empresa conta com redução de 75% do Imposto de Renda e Adicionais calculados com base no lucro da exploração. No âmbito estadual, a empresa goza de 7 diferentes programas de benefícios fiscais que, de diferentes formas, reduzem entre 75% a 99% do ICMS a ser pago. Ainda no campo estadual, a empresa possui 2 regimes especiais exclusivos às suas operações, que conferem benefícios de diferimentos parciais de ICMS. Apenas um grupo industrial, 10 diferentes regimes de incentivos fiscais usufruídos.


Um grupo industrial do porte usado nesse exemplo (mais de R$ 2 bilhões de faturamento anual) possivelmente tem posicionamento contrário a uma reforma tributária, que o colocaria em pé de igualdade a outras empresas que não gozam de tantos benefícios. Ao mesmo tempo, em público, possivelmente defende que o sistema tributário brasileiro é caro e complexo e, por isso, precisa de compensações para seguir operando no país, inclusive por meio da baixa integração internacional, pois o sistema tributário brasileiro lhe tira competitividade e, por isso, ela não pode competir globalmente.


Ou seja, um importante grupo industrial, como o descrito no exemplo, pode ter trabalhado, e seguir trabalhando, contra o andamento de qualquer discussão de reforma tributária, ainda que de forma reservada, não transparentemente sobre a mesa. O trabalho de defesa de seus interesses certamente envolve a articulação com diversos representantes políticos, especialmente os pertencentes aos estados e municípios onde a empresa tem operações. Alimenta-se, assim, ainda mais o “impasse” político em torno da reforma tributária.


Não está claro para o público em geral, tampouco para os políticos, quais são as empresas que possuem benefícios fiscais, quais são os benefícios, quanto cada empresa efetivamente recolhe de tributos, entre outros detalhes. O fato é que não existe “almoço grátis” e alguém sempre está pagando uma conta que o outro está deixando de pagar.


As contribuições do setor privado para o debate da reforma tributária precisam, portanto, passar da superficialidade de que o setor é favorável à uma reforma.


Todas as nuances precisam estar sobre a mesa.


É preciso ter maior clareza, transparência e detalhamento dos números e do posicionamento de cada setor. É preciso identificar as discrepâncias e desbalanceamentos, encontrando, assim, um novo sistema que seja justo e eficiente para o desenvolvimento do Brasil e não para acomodar os milhares de interesses particulares que foram produzidos a partir do manicômio que nós brasileiros criamos e alimentamos. 

 

O setor privado precisa dar o exemplo de compromisso que o Brasil tanto precisa dos representantes políticos, que em breve serão eleitos. 

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